Ser mulher

08/03/2023

Hoje celebra-se o dia da mulher, e por isso decidi partilhar um texto escrito há uns anos sobre os problemas que o ser mulher acarreta. Hoje é o dia em que o nosso género é felicitado e presenteado, enquanto nos restantes dias somos tratadas maioritariamente com violência e proibição de direitos. Hoje, dia da mulher, não é apenas dia de celebrar o nosso ser, mas também recordar as nossas lutas e sofrimentos até aqui, e como muitas dessas lutas e sofrimentos perduram até ao dia de hoje, mesmo com o evoluir do tempo e da sociedade. 


Ser Mulher 

Desisti, vim embora. Não tolerava mais a forma como os meus direitos enquanto pessoa, e principalmente enquanto mulher, eram postos em causa. 
A sociedade vê na mulher o alvo fácil, a presa na mira de ser caçada, o elemento frágil com um caráter inferior ao do homem. Tal situação resume-se ao medo de sair de casa, e em paralelo à obrigação de ter que o fazer para se poder sustentar e viver. Há momentos em que até da nossa própria sombra temos medo, como se a qualquer momento ela ganhasse vida e nos atacasse, física ou verbalmente, com um apalpão indesejado ou um piropo não solicitado. 
Ganhamos um medo quase irracional de elementos banais do quotidiano, como um grupo de homens à porta de uma tasca, ou num banco de jardim. Tudo isto porque é a visão e o trauma que a sociedade nos incute. Visualizando um grupo de homens, automaticamente a nossa mente entra em completa desordem, com medo de que qualquer comentário ou aproximação seja feita sobre, e, ao nosso corpo, corpo que nos pertence, do qual possuímos direitos, muitas vezes desrespeitados. 
O assédio é visto como uma "piada parola que não faz mal a ninguém", mas faz. O piropo é visto como um ato inocente, quando na verdade resulta numa perturbação do estado de espírito de quem é obrigado a ouvi-lo. 
Ser mulher é andar à noite, sozinha na rua a olhar para todo o lado, para cada esquina, cada beco, sempre com a sensação de perigo no pensamento, como uma assombração. 
Temos em nós a obrigação de ser autónomas e paradoxalmente não é segura a nossa solidão. 


 Inês Marques

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