A casa do avô

Ao fim de dois anos regressei à casa do avô. Não voltei a pisar o interior, mas acredito que tudo se mantivesse igual, desde o pó dos móveis até às mantas dobradas em cima da arca, agora já com os rebordos desfeitos pelos animais que deles se alimentam, e pelo tempo.
O quintal estava diferente. O que antes era um terreno trabalhado, arranjado e utilizável, com espaço para eu e os meus primos brincarmos, é agora um local que grita abandono, descuido, desinteresse. Todo aquele espaço que outrora foi um espaço de convívio e alguma união familiar, é agora um acumular de mato, insetos, roedores, teias de aranha, gatos, que por lá procuram alimento.
Deixou de ser a casa do avô, para ser mais uma casa abandonada na aldeia. É uma situação recorrente nas grandes famílias, quando não gera lucro, gera desinteresse, como se a dignidade humana fosse definida por cifrões.
E, como esta, estão as restantes casas da aldeia, casas que deixaram de ser a casa do avô ou da avó, para passarem a ser a casa da natureza, abandonada e desprovida de presença humana. Natureza esta que entra pelas casas como que por vingança pelas construções e ações humanas, como se quisesse recuperar o que é seu.
Podemos dizer que foi uma troca. A natureza, tanto florestal como animal, ocupa a velha casa de pedra, que antigamente dava pelo nome de "casa do avô", enquanto o avô descansa naquela que é a casa da natureza, o solo.