Dissabor da despedida

09/06/2022

O padrinho já não está cá, a madrinha está sozinha, os filhos sem pai, os netos sem avô. O avô também já foi. As únicas semelhanças entre os dois são os filhos sem pai e os netos sem avô. Ninguém do mundo terrestre tem mais o privilégio da sua presença, da sua recepção calorosa, e da alegria por companhia.

Acredito que o padrinho possa estar com o avô, os dois sentados a uma mesa de madeira já velha e manchada, com algumas falhas nas laterais, correspondentes à passagem do tempo, enquanto um garrafão de vinho, daqueles brancos como antigamente era comum. Enquanto bebem, reclamam das atrocidades que fazemos em baixo, discutindo o que fariam se estivessem cá para manter ordem. Tocando no assunto de ordem, eram dois homens com capacidade de meter ordem no que estava desordenado, mas também de desordenar o ordenado. Dois homens os quais tiveram várias peripécias ao longo da vida, que mereciam um final feliz e indolor, mas que em oposição tiveram uma pré-morte sofrida e torturante. Dois homens aos quais o devido valor só foi dado, quando já não era possível demonstrar, nem por ações, nem palavras, nem qualquer outra forma de linguagem existente.

Não me considero uma pessoa de fé, mas se existe um paraíso, espero que seja o lugar deles. A despedida não foi feita a nenhum dos dois, mas espero que lá no paraíso deles, tenham presente o amor sentido pelas suas pessoas, e a dor pelas suas partidas, enquanto brindam à vida dos que cá ficaram.

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